Conversas Noturnas

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– Qual o tema?

– O básico.

– Sobreviver?

– Inventar um destino.

– Qual o sentido disso?

– Eu já parei de fazer sentido há tempos.

– Você ainda chora por horas a fio até adormecer?

– Sim. Mas agora a noite me dá a graça de me acordar com a luz da lua.

– Ela cobre seus azulejos, magnífica por detrás das nuvens?

– Você vê também?

– As árvores do parque em sua silhueta mais nua.

– Enuvencendo a lua?

– Enuvencendo existe?

– A mulher que faço amor todas as noites também não existe. Apesar de surgir e desaparecer entre minhas pernas quando penso estar me apaixonando.  

– É a saída para essa angústia que te engole.

– O pré-requisito para o que desejo.

– A narradora da sua história sabe o que está fazendo?

– Nunca perguntei.

– Eu quero saber.

– Você sabe que eu me apaixono facilmente por nuvens.

– Essa sua boca molhada é sempre um desejo de algo a mais.

– Estou sempre em movimento.

– Você devia procurar algo mais fixo.

– Eu não tenho vocação para ser parede.

– Espelho?

– O ideal seria me deitar, mas quero continuar te olhando.

– Esse seu querer de dois lugares corre o risco de deslocar sua retina.

– Sempre há risco.

– Às vezes acho que te disse algo mas é só um pensar fundo e com muita intensidade.

– O que exatamente você quer dizer?

– Que sou uma mulher desabordada da necessidade de bordar qualquer coisa.

– Alta periculosidade. Assustador.

– Um pulo além da ordem do impossível.

– O possível do desejo te assusta? Daí essa sua penetração peixe.

– Vou me esvaziar.

– Posso tentar fazer margem?

– O vazio é o suporte do meu desejo.

– Desirée.

– Você fala meu nome para me atravessar.

– Estou no teu outro lado. E agora, faço o que?

– Agora há tempo. Uma toda outra saiu de mim.

@letradodesejo